segunda-feira, setembro 19

Precisamos falar sobre a morte





Existem muitas ideias erradas sobre a morte e isso faz com que quase ninguém fale sobre esse assunto sem se corroer de medo e aflição. E também não faltam bordões sobre a morte, máximas como “ninguém voltou para contar”, ou “para morrer basta estar vivo”, tem ainda “a única certeza que se tem nessa vida é a morte”. De modo geral existe um pânico e uma fobia quando se fala sobre o dia em que não estaremos mais aqui, tamanha a aflição causada por esse assunto que se tornou um tabu, uma parte obscura da breve experiência humana sobre o planeta Terra, pensar e falar sobre a morte.  

A cultura ocidental religiosa e a tradição naturalizaram a concepção de que a morte deve nos encontrar numa idade avançada, que aconteça sem dor, sem sofrimento, de preferência depois de já se ter conquistado muitas coisas e realizado muitos sonhos. Para muita gente que crê, a vida humana é tão mais especial que a dos outros animais, que depois de morrer nossas almas retornam a este mundo de outras formas, que dependendo da forma como vivemos depois de morrer iremos para um lugar bom (Céu) ou ruim (Inferno), ou ainda que simplesmente a vida é o que se vive enquanto se está vivo, não existe nada depois disso.   

Ninguém gosta de falar sobre a morte, talvez porque ninguém realmente entenda ou saiba o suficiente para dar alguma opinião convincente que tranquilize o nosso próprio ego, contrariando a expectativa de que essa vida um dia pode acabar. Outra coisa perturbante quando se tenta falar sobre morte é a sensação de que existe ou deveria existir um momento certo para a despedida. No entanto, assim como a vida, a morte é totalmente imprevisível e nem sempre pode ser explicada de forma racional ou progressiva como se houvesse um motivo que justifique seu acontecimento.

De fato, a única certeza é que lentamente ou não, caminhamos para o fim de nós mesmos. Desde o nascimento já sabemos o que nos aguarda e a morte não deveria ser ritualizada da forma negativa como geralmente se tem feito. A origem e o fim de uma vida fazem parte do mesmo processo, compõem a mesma dinâmica, são faces opostas de uma mesma moeda, completam o ciclo da vida e da experiência nesse mundo. Saber que essa vida não é eterna nos obriga a aceitar que não adianta acumular bens materiais ou achar que alguém é capaz de superar o efeito do tempo ou das circunstâncias sobre nossos corpos, tudo tem seu tempo.

Incomoda o recorrente esoterismo quando se trata da morte. Existem tantas histórias bonitas de nascimentos, mas nunca se ouve falar sobre histórias de uma bela e abençoada morte. A morte é sempre recebida com sentimentos de confusão, rebeldia, angústia e por uma enorme sensação de impotência. Poucas pessoas conseguem aceitar a morte por um viés bom, perceber que nem só a sobrevivência e a sua continuidade fazem parte da vida. Cada dia de vida deve ser vivido sabendo que caminhamos para a morte – que a qualquer momento – por motivos fúteis ou não estaremos partindo.

O desespero, a impotência e a comoção generalizada por causa da morte só alcançam quem sabe que não viveu da melhor forma, que deixou de aproveitar bons momentos com outras pessoas porque estava mais dedicado/a a materialidade dessa vida do que a temporalidade da existência. Se alguém está vivo, esse alguém está caminhando para a morte e não muito diferente do nascimento, esse momento deveria ser recebido com o mesmo sentimento de êxtase e realização. Só morre bem quem vive sabendo que vai morrer e não tem medo de viver.          
       

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